sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

BRINCADEIRAS

Gostava de viajar. Claro, quase todos adoram viajar. Mas ela tinha um prazer especial. Não viajava só para visitar pontos turisticos especifios ou pra provar da culinária local. Viajava porque gostava de sentir a cidade. Gostava de analisar suas sensações nos variados  lugares, de perceber como cada local a fazia se sentir diferente.

Adorava brincar de percepção urbana. Sabia pra onde ir, dependendo do que sentia. Como? Fácil. Se se sentisse triste, pequena ou presa, ia para uma cidade sem prédios muitos altos, mais horizontal, sem muitos muros, na qual não dependesse de meios de transportes ou de filas pra conseguir o que quisesse. Ia pra um local como a praia com menos muros, mais sociabilização, sem tempo, sem pressa.

Se agisse com prepotência, tentava se deslocar pra uma metrópole, com edificações altas, trânsito, correria, só para se lembrar de quão pequena era frente ao mundo, mas que, mesmo sendo um único ponto em meio a multidão ainda assim fazia parte do todo e era importante pra isso.

Descobriu essa brincadeira quando já estava mais velha. Mas não que fosse tarde demais. Ficou feliz por descobrir enquanto ainda podia explorar esse mundo, traçar planos mais ousados . Passou a entender  melhor gerações anteriores, a compreender com mais clareza a arquitetura e a composição urbana. As intenções passadas se tornavam mais óbvias e mais justificáveis, tudo fazia mais sentido.

Então, viu que a brincadeira não se restringia a cidades, mas que também poderia ser aplicada as atitudes humanas. Cada qual analisada dentro de seu contexto, se sua escala, de seu valor dentro da vida da pessoa em questão. Confuso? É talvez, mas para ela tudo isso se tornou muito simples.

Entendia que grande parte das ações das pessoas que a cercavam estavam baseadas na bagagem histórica de cada uma delas e na impressão que queriam causar aos demais. É simplesmente se colocar no lugar da outra pessoa nas diferentes situações cotidianas que nos parecem estranhas. Quando não entendia uma atitude alheia, pensava em que situação poderia estar agindo igual. Fazia tal atitude  ser justificável  e assim enxergava as pessoas com mais humanidade, com mais identificação.

Claro que ela possuia sua própria bagagem, o que em determinadas situações interferia bastante. Mas considerava isso normal. Ela fazia parte do todo e assim, tinha sua individualidade a ser respeitada. Algumas vezes se revoltava ou não compreendia pequenos detalhes, mas logo se conscientizava que nem tudo é pra ser entendido e era isso que fazia a brincadeira ser mágica e instigante.

Se acostumou a pensar assim. Na verdade era mais leve pensar assim. Se familiarizava mais com os locais e com as pessoas. Aprendeu a passar horas observando desconhecidos, como se assim eles pudessem fazer um pouquinho parte da sua história. Encontrou a graça na diferenciação.

Hoje ela continua adorando viajar. Agora procura sempre em seu roteiro deixar um pouco mais de tempo ocioso, pra se sentar em uma praça e ou um famoso espaço público do local e simplesmente observar, aprender lições que a vida insiste em nos mostrar, mas que nunca temos tempo pra perceber.

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